Alpinista de Mutá

O início de tudo é uma conformação anti-caos. Queria dizer desse estado de coisas poéticas e poeirentas que vemos nas esquinas e seringais. Esse, do caos surgido, como resposta ao favor natural de conformar as falsas harmonias, pretende-se ao em espera do universo. Acredita poder surgir do conflito uma natureza e uma possibilidade de identidade (inda que arbitrária) que nos conduza a uma atitude de agressão ao espaço sedentário. É poesia isso. E inspira-nos Hélio Melo, autor da floresta, com sua representação do real. Conduz-nos o tempo e a sombra desse tempo, numa hora incerta a dar declarações sobre a pele do concreto e dos óbulos. Vamos caminhando, nos atrepando em árvores e rios, alpinistas de mutá, alcançado pouca coisa mais que a geometria curta dos dedos, mas sonhando extrair dali uma essência sublime para negociar a vida.

sexta-feira, 13 de junho de 2008

Os condenados da terra





FRANTZ FANON (1925-1961)

Para o colonizado a vida só pode surgir do cadáver em decomposição do
colono, dado que o colonialismo significou a morte da sociedade autóctene.
Abater o colono é matar o opressor e o oprimido (Frantz Fanon)

Médico psiquiatra. Natural da Martinica e formado em Lyon. Médico na Argélia em 1953, demite-se em 1957 e passa para a Tunísia, juntando-se à Frente de Libertação Nacional. Torna-se argelino, participando na guerra da independência da Argélia entre 1954-1962. Ministro da informação do governo provisório da República Argelina. Um dos principais teóricos dos movimentos ditos de libertação nacional do chamado Terceiro Mundo. Considera, numa perspectiva psiquiátrica que a descolonização é sempre um fenómeno violento, a expressão de uma necessidade psico-sociológica, prenchendo uma dupla função: libertação em face do opressor e reconhecimento de si mesmo. Porque para o colonizado a vida só pode surgir do cadáver em decomposição do colono, dado que o colonialismo significou a morte da sociedade autóctene. Abater o colono é matar o opressor e o oprimido. Acaba por morrer de leucemia, mas em Washington, depois de, primeiro, a tentar tratar em Moscovo.
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Os comentários possíveis ao livro de Fanon fogem por muito à ordem do pitoresco. Se inscrevem na ordem das contestações do poder e dão um novo fim às dicotomias inscritas na opção do colonizado que aceitar o poder dominante ou de negá-lo com revoluções que mantêm as estruturas da dominação. Fanon se coloca num dominio que assuta, mas que ao mesmo tempo é reflexo da única atitude digna possível: a violência.
Fanon não se contenta apenas com uma análise puramente econômica do imperialismo. Ele teoriza também o conflito identitário e cultural, tentando mostrar que os verdadeiros condenados da terra, os que são explorados absolutamente, são os colonizados.
Baseado não somente na teoria, mas adotando uma abordagem da experiência pessoal, Fanon observa as consequências de anos de submissão do povo e da "colonização do ser", como mesmo escreve.
Para se colocar contra a ordem estabelecida, o autor afirma que é preciso negá-la em absoluto, inclusive dentro de si mesmo. Não se pode apenas tomar o poder e reproduzir a ordem do colonizador contra o próprio povo, como fizeram os Estados Unidos, que se tornaram uma nova Europa. Fanon não quer transformar a Argélia numa nova Europa. Por isso mesmo, o triunfo da descolonização depende de vários fatores, um deles é a violência. O colonizado, por isso, desde sempre, deve estar preparado para a violência.
Esse é o ritmo do livro, escrito no leito de morte, e que conserva em si a inquietação dos condenados à liberdade. Leiam Fanon e comecem pensar nessa ordem de contestação.
Sobre o autor recomendo o artigo de Walter Günther Rodrigues Lippold, texto importante e que de maneira rápida nos remete ao autor e ao pensamento anti-colonização.
Fanon é atual, e através dele podemos nos reconhecer e contestar a colonização da modernidade. É com certeza uns dos melhores livros para se ler na vida.

Um comentário:

Anônimo disse...

Olá, sou o Walter que escreveu o artigo, logo vou lançar um livro sobre Fanon pela editora expressão popular. Obrigado pela força, pela citação. Abraços.