Jacinto havia perdido os arquivos de sua tese de doutorado em física que passara quatro anos para concluir, da qual dependeria totalmente seu brilhante futuro profissional. Além do original em seu lap top, perda total num acidente, Jacinto ainda depositava esperanças de conseguir recuperar a única cópia existente em seu pen drive; ele não poderia fazer muitas cópias, pois tratava-se de um projeto muito ambicioso, exigindo sigilo absoluto; não poderia correr o risco de ser plagiado.
Às vias do desespero, após tentar de tudo, ter esgotado todas as possibilidades, Jacinto procura uma rezadeira que faz umas rezas com umas folhas de arruda em seu pen drive e lhe indica um cyber-terreiro – que além de terreiro era também lan house, um local místico de conexão total, plena –, para que as rezas tivessem efeito, assim como para levar uns aconselhamentos, pois neste cyber-terreiro baixam uns “cabocos” que tem pós-doutorado em microeletrônica e sistemas de informações.
Chamou a atenção de Jacinto o som transe e techno, seus estilos musicais preferidos, que as “baianas” bailavam, com seus atabaques, agogôs e outros instrumentos percussivos eletrônicos. Na sessão, os “cabocos” e “pretos velhos” lhe disseram para ir à uma determinada mata para pegar umas determinadas folhas e cipós para fazer um chá – Jacinto ainda pensou o que teria a ver o chá com seu pen drive, mas àquelas alturas para ele já valia tudo –, assim como uns insetos exóticos e uns objetos incomuns para fazer umas simpatias e uns rituais estranhos.
Após alguns meses repetindo constantemente essa rotina, Jacinto já não lembrava mais o que tinha ido fazer no cyber-terreiro – na verdade, não lhe importava nem um pouco. Não se preocupava mais com coisas banais como física ou dinheiro ou carreira profissional. Havia trocado a ciência material pela consciência transcendental, dominando o processo da metamorfose da carne em luz e da luz em carne.
Hoje Jacinto vive em uma outra galáxia, numa aldeia sideral onde estuda para ser xamã, mas de vez em quando ainda vem em visita a este planeta. Um de seus passa-tempos preferidos é visitar o soberano de um pequeno planeta vizinho chamado B612, com quem gosta de contemplar o pôr do sol várias vezes seguidas – como B612 é um planeta pequeno, basta se sentar um pouco mais à frente para ver o sol se pondo novamente.
Armando Pompermaier
Alpinista de Mutá
O início de tudo é uma conformação anti-caos. Queria dizer desse estado de coisas poéticas e poeirentas que vemos nas esquinas e seringais. Esse, do caos surgido, como resposta ao favor natural de conformar as falsas harmonias, pretende-se ao em espera do universo. Acredita poder surgir do conflito uma natureza e uma possibilidade de identidade (inda que arbitrária) que nos conduza a uma atitude de agressão ao espaço sedentário. É poesia isso. E inspira-nos Hélio Melo, autor da floresta, com sua representação do real. Conduz-nos o tempo e a sombra desse tempo, numa hora incerta a dar declarações sobre a pele do concreto e dos óbulos. Vamos caminhando, nos atrepando em árvores e rios, alpinistas de mutá, alcançado pouca coisa mais que a geometria curta dos dedos, mas sonhando extrair dali uma essência sublime para negociar a vida.
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Um comentário:
Oi Márcio, estou no momento "social" do meu blog, ou seja, naquele que temos que fazer visitas e coisa e tal, para que alguém dê uma passada no seu blog e deixe um comentário, aí a rede começa a funcionar... putz, é um troço político pra caramba. Voltando a vaca fria, da qual não saí, passe por lá: http://quintalglobal.blogspot.com/
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